domingo

Visita ao Projecto Teatral - Estufa

O meu olhar

Ora sem conectores… à Aloysyo Filho, professor.

2006/02/25. Sábado à noite, 22h.
Rua Caetano Palha, nº 37 r/c – perto do Poço dos Negros, na baixa lisboeta.
Visita projecto teatral. estufa.
Casa antiga, século passado. Recepção, conversa, chá.
3 salas contíguas. Terceira sala escura, paredes pintadas, motivos rurais, um microscópio iluminado, mensagem, passagem, saída-entrada, espaço aberto ao céu estrelado, muros, estufa de vidro.

Descrição pormenorizada e os porquês.

Ora com tudo, porque não.
Cederam um livro à entrada com a informação necessária, com fotografias a preto e branco e a cor sobre a planificação, o processo desenvolvido e os primeiros rebentos nascidos nos estufins.
Porquê projecto teatral? Será porque foca a realidade e a vida orgânica? como única forma de vida? e os organismos individuais como individuação da vida em geral? Paralelismos com o crescimento do actor?
Naquele lugar existia um jardim selvagem que nasceu e cresceu sem cultura, sem cuidado especial, com plantas e algumas árvores.
Vi uma estufa de vidro, com variadíssimas plantas e leguminosas, com e sem flores, com e sem vagens, verdes e viçosas, outras secas de um lado e com rebentos do outro, havia outras ainda que se encontravam em estado de regeneração. Estavam colocadas em cima de mesas rectangulares com buracos circulares para a água escorrer - que alimentam as ervas daninhas, as urtigas que crescem no chão. Vi também dois belos gatos, um amarelo e outro preto, imponentes, serenos, enormes.
Porquê a natureza? Reflecti no silêncio. Há semelhanças que estão aqui comprovadas. Raciocínio por analogia biológica?
Facultaram-nos um segundo livro com fotografias tiradas sobre o processo de delineamento, marcações dos alicerces, edificação da estrutura física, o cuidar, o mimar, o crescer dos pequenos rebentos, o tempo, a respiração projectada na humidade dos vidros, as porções minúsculas às pinguinhas como pequenos ornatos de arquitectura ou escultura – cutículas.
Troquei algumas destas ideias com os autores do projecto, às quais me responderam: «Nós não procuramos respostas, perguntas sim.»
Antes de ir, vi o sistema de rega a funcionar, ah… que contemplação, aplausos para os actores!
Simplesmente, ficou claro…irei lá mais vezes com pessoas amigas.
Regozijei-me felicitando-os.

Quando felicito os autores do projecto teatral é também pela sua coragem, ousadia, é uma afronta ao espectador, que se sente imediatamente descompensado. Lembrando os meus antepassados, por exemplo, não sei até que ponto o projecto teatral poderá ser considerado arte, mas o que é arte afinal? as fotos são muito boas, a estufa agradável, as plantas – os actores - passivamente apoiadas pelo instituto das artes.

Enquanto estava na estufa, ocorreram-me os textos que li de Rainer Maria Rilke, nas Cartas a um jovem poeta (sugerido pelo professor Jean Paul Bucchieri) que passo a citar:
« (…) o que vejo, o que vivo, o que amo, o que perco, sinceridade íntima, as minhas tristezas, as minhas alegrias, a minha fé na beleza – calma e humildade. Exprimir tudo. (…) Para o criador nada é pobre, não há sítios pobres, indiferentes. (…) Sem jamais exigir uma recompensa exterior. O criador deve ser todo um universo para si próprio, tudo encontrar em si próprio e nessa parcela da Natureza. A introspecção nunca é em vão. Caminhos próprios, bons, felizes, longos… para o essencial, estamos indizivelmente sós. (…) Para um só êxito é necessária uma constelação de acontecimentos.»

Surgiram também algumas imagens no meu pensamento, as aulas de interpretação com o professor Dmitry Bogomolov, para melhor explicar a ponte que fiz com esta visita, cito um poema de Inês Franco Frazão:
« (…) Silenciar para ouvir. Silenciar para ver.
Silenciar para aprender. Silenciar para meditar.
Silenciar para falar. Silenciar para partilhar.
Silenciar para humanizar. (…) »


Dina Zamora

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